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Você se lembra quem você era antes do mundo te dizer quem você deveria ser?

  • Foto do escritor: Ana Elisa Gonçalves Bortolin
    Ana Elisa Gonçalves Bortolin
  • 9 de set.
  • 2 min de leitura

A famosa frase atribuída a Charles Bukowski provoca uma reflexão profunda sobre autenticidade. O que acontece conosco quando, em vez de seguirmos o que sentimos e desejamos, passamos a moldar nossa vida conforme as expectativas externas? Essa questão é central não apenas na literatura, mas também na psicanálise e na psicologia existencial.



O olhar da psicanálise



Freud (1923/2011), em O Eu e o Id, explica que o superego representa a internalização das normas, valores e exigências da sociedade e da família. Ele funciona como uma voz crítica e reguladora, indicando ao sujeito o que deve ou não fazer. Isso significa que, desde cedo, nossa vida psíquica se estrutura a partir de um confronto entre desejos pessoais e imposições externas.


Winnicott (1983), ao estudar o desenvolvimento emocional, acrescenta que, diante dessas exigências, muitas pessoas deixam de expressar sua espontaneidade para se adaptarem ao ambiente. Surge então o falso self, uma espécie de máscara social que protege, mas também distancia o indivíduo de seu verdadeiro self. Quando isso acontece de forma crônica, o sujeito perde contato com sua vitalidade e criatividade.



A perspectiva da psicologia humanista e existencial



Carl Rogers (2001) reforça esse entendimento ao afirmar que a busca por aprovação externa pode levar o indivíduo a negar suas próprias experiências. Para ele, o processo terapêutico é justamente um caminho de reconciliação com o self, possibilitando que a pessoa se torne quem realmente é.


Já Rollo May (1982), em uma perspectiva existencial, ressalta que a criatividade e a coragem de ser autêntico são forças essenciais para enfrentar a vida. Quando cedemos totalmente às pressões sociais, corremos o risco de viver de forma inautêntica, desconectados de nossa essência.



Na prática clínica



Na clínica, esse tema aparece com frequência em pacientes que relatam sentimentos de vazio, angústia ou desorientação em relação a quem são. São pessoas que seguiram caminhos ditados pela família, pelo mercado de trabalho ou pela cultura, mas que perderam contato com seus desejos.


O manejo clínico, nesse caso, envolve oferecer um espaço de escuta livre de julgamentos, sustentando o silêncio e fazendo interpretações que favoreçam o reencontro do paciente com sua autenticidade. O analista ajuda a distinguir o que é imposição externa e o que é expressão do desejo singular. Trata-se de um processo delicado, mas que pode abrir espaço para maior liberdade psíquica e para uma vida mais verdadeira.



Conclusão



A frase de Bukowski nos lembra que a autenticidade não é algo dado, mas um processo que precisa ser cultivado. A psicanálise e a psicologia humanista mostram que, embora o mundo imponha formas de ser, é possível resgatar nossa verdade interior. Na clínica, esse resgate acontece pouco a pouco, na medida em que o paciente encontra espaço para se escutar e se autorizar a existir de forma mais plena.





Referências



FREUD, Sigmund. O Eu e o Id (1923). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas, volume 16. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.


MAY, Rollo. A coragem de criar. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.


ROGERS, Carl. Tornar-se pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 2001.


WINNICOTT, Donald W. O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artmed, 1983.

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